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14 de dezembro de 2016

Maestria da mente (3) - os macacos descontrolados


Que fazer com os macacos soltos na cabeça?

"O objetivo de cada alma é a liberdade, a maestria, a liberdade da escravidão da matéria e do pensamento, a maestria da natureza externa e interna."
Esta é uma frase de Swami Vivekananda, um dos mais respeitados mestres espirituais dos tempos modernos. Ele foi praticamente o primeiro iogue indiano a aparecer antes dos olhos ocidentais. No primeiro Parlamento das Religiões Mundiais, realizado em Chicago em 1893, ele impressionou muitos com sua simplicidade e clareza. Apenas dizendo o óbvio, "Irmãs e irmãos da América!", ele foi aplaudido de pé durante dois minutos pelos sete mil presentes. Em determinado momento, chamou a atenção gentilmente para a prisão das nossas respectivas crenças. Contou a história de um sapo que acreditava que o poço onde morava era o único no mundo sobre o qual queria saber e que se recusava a acreditar que poderia haver outros.
"Isso sempre tem sido a dificuldade. Eu sou um hindu. Estou sentado no meu pequeno poço pensando que ele é o mundo inteiro. O cristão se senta no seu pequeno poço pensando que aquele é o mundo inteiro. O mulçumano se senta no seu pequeno poço pensando que ele é o mundo inteiro."

Esquecemo-nos confortavelmente que crenças e práticas são, na sua maioria, externas ao nosso ser mais profundo. Conforme vamos mais para dentro da experiência do estado interior, nos afastamos de palavras, símbolos, rituais e até mesmo das diferenças religiosas. Apesar das nossas diversas culturas e tradições, somos muito parecidos em nossos núcleos espirituais. É como se a mente estivesse presa em seu estado mais superficial onde ela não tem nenhuma chance de controlar a si mesma.
Em seu livro clássico, 'Raja Yoga', ele compara a mente com as palhaçadas de macacos. Não apenas qualquer macaco, mas um macaco bêbado pelo vinho do desejo, envenenado pelo escorpião do ciúme e possuído pelo demônio do orgulho. Mesmo se sua metáfora seja forte, todos nós podemos compreende-la. É fácil entender que, se apenas ficamos observando as travessuras do macaco, embora podemos acalmá-lo, não poderemos alterá-lo.
Procurando por um paralelo a esta falta de controle na espiritualidade ocidental, me deparei com um clássico inspirado de Thomas à Kempis, A Imitação de Cristo - do século 15.
"Sempre quando um homem deseja alguma coisa além da medida, ele imediatamente se torna inquieto. O homem orgulhoso e avarento nunca está em repouso; enquanto os pobres e humildes de coração permanecem em uma abundância de paz."

Apesar de sua linguagem arcaica, qualquer pessoa de qualquer tradição pode se relacionar com esta explicação das razões para a inquietação mental. Assim, precisamos saber como a mente funciona, a fim de controlá-la.
A partir da experiência de mais de quarenta anos como estudante e professor de meditação Raja Yoga, eu ainda me sinto como um novato quando vejo a infinidade de coisas que ainda preciso aprender sobre meu mundo interior. Posso dizer honestamente que o problema não é a mente em si, mas o que acontece nela. Num nível superficial, a meditação pode ser “não pensar em nada” na tentativa de produzir clareza. Assim dizem os adeptos modernos. Na realidade, tenho que entender o que está criando os milhares de "destroços" na mente e lidar com isso.
Em um nível básico, a mente é como uma praia onde as ondas da atividade mental estão quebrando. Há um mar de experiências passadas e possibilidades futuras que gira para lá e para cá, de uma forma aparentemente aleatória à medida que tentamos lidar com o que está sendo trazido à praia. Se permaneço como uma testemunha passiva do jogo das ondas, posso ficar anestesiado pela incessante inquietude. Eu esqueço que sou o mestre sentado na praia e não apenas um observador impotente. Eu não sou a praia da mente. Eu tenho uma mente. Eu sou o criador do meu mar de experiências e tudo que vem com ele. Eu tenho um intelecto através do qual posso escolher conscientemente o que eu quero pensar e o que fazer com ele, uma vez que eu o criei.
Talvez o maior obstáculo para o controle do mundo interior é a própria palavra "controle". A imagem imediata do controle da mente é alguém fazendo esforços árduos para restringir, regular ou aplicar um freio para as coisas que o mar está jogando na praia.

Na minha própria prática, tenho visto que o poder espiritual e a qualidade da atividade mental estão relacionados. É como se houvesse um interruptor interior do tipo dimmer. Conforme eu aumento meu poder espiritual através da meditação, há luz suficiente para enxergar as coisas claramente. A negatividade desaparece no fundo e um senso de controle natural surge. Conforme eu levo o dimmer para baixo, as sombras voltam trazendo consigo a inquietação.
Um exemplo fácil é entender a relação entre a expectativa e a plenitude. Conforme meu sentimento de plenitude interna sobe, não há nada que desejo ou espero dos outros ou das situações. Conforme ele vai para baixo, todos os tipos de desejos surgem tentando compensar o vazio interior.
Então, toda a questão da maestria mental está relacionada com a quantidade de energia espiritual que posso gerar e acumular. Com a minha bateria interna cheia posso enfrentar qualquer coisa. Se não, as situações quase sempre serão mais fortes que a minha capacidade de lidar com elas, trazendo consigo uma sequência interminável de pensamentos inúteis e negativos.
Então, como carregar a bateria? Vou abordar este tema no próximo post.

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