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26 de novembro de 2016

Maestria da mente (1) - o papel dos nãos



Quantos milhares de ‘nãos’ uma criança ouve até os seus seis anos de idade?

Não faça isso. Não toque nisso. Não responda.

Mesmo a palavra ‘infante’ significa ‘aquele que não fala’ - aquele que se cala e fica amuado em um canto. Ao longo da vida, e de forma silenciosa, vamos construindo uma resistência aos ‘nãos’. Entramos em apuros quando a nossa curiosidade se torna mais forte que a tentação e acabamos desobedecendo os nossos pais ou professores. Escutar um não se torna um problema perene.

A maioria das tradições religiosas têm também os seus mandamentos.

Não roube. Não minta. Não cometerás adultério ou violência.

Mesmo assim, não percebemos que a criação de listas de regras morais e sociais não garante que as pessoas consigam segui-las. O primeiro mandamento de amar a Deus antes de tudo é colocado de lado de acordo com a conveniência do momento. Ele é o último em quem pensamos, sobretudo quando as coisas dão errado e começamos a sofrer.

Certa vez uma pessoa próxima tornou-se presidente da câmara municipal de São Paulo. Ele me disse que um dos seus objetivos era reduzir as 11.000 leis locais para 8.000. Mesmo que o número tivesse diminuído no seu mandato, parece que o comportamento das pessoas não tenha alterado de forma significativa. Elas ainda jogam lixo na rua e estacionam em lugares errados. Tanto é assim, que a chamada ‘indústria das multas’ tornou-se uma importante fonte de renda para a cidade.
Em essência, o progresso tem significado mais leis, mais juízes e advogados e ainda mais infratores e prisões. O padrão se repete.

Muitos anos atrás, eu tinha acabado de voltar de uma longa viagem ao exterior. Durante minha ausência, o presidente fez uma desastrosa tentativa de conter a inflação galopante do país, algo do qual eu sabia vagamente. Ao visitar o sul do Brasil, fui convidado a participar de um debate tipo painel, na TV ao vivo, sobre assuntos atuais. Muito rapidamente o principal assunto no painel foi o de atacar o presidente. Quando chegou a minha vez, sem justificar o que o presidente tinha feito, eu mencionei que sentia compaixão por qualquer líder neste mundo caótico, que tentava controlar o que as pessoas fazem, quando individualmente quase ninguém faz um esforço para controlar suas ações e muito menos suas mentes. Esta posição mais espiritual imediatamente tornou-se o foco das críticas dos painelistas.

Talvez se alguém mais no começo das nossas vidas tivesse nos ensinado como controlar nossas mentes, todo o caos e os inúmeros regulamentos que tentam contê-lo seriam muito menores. O problema é que não existem candidatos para ensinar o ‘controle dos pensamentos’. Aqueles que são “nossos mais velhos” também não aprenderam esta arte. Alguém que simplesmente dizia ‘não’  não conseguiu substituir em nós uma compreensão e controle naturais do que fazer e do que não fazer.

Foi assim que crescemos com músculos mentais e emocionais muito flácidos. Muitos que começam a prática de meditação afirmam que ela não funciona. Eles esquecem que, exceto para os poucos sortudos, suas mentes nunca trabalharam num estado óptimo.

Aprendemos a falar, andar, cantar e até mesmo cozinhar. Ninguém jamais nos ensinou como pensar. A atenção fica pulando como abelhas em um campo de flores. Podemos estar sujeitos a até 100.000 destroços da mente em um dia*. Pensamentos, sensações, memórias, inspirações, ideias, sentimentos e desejos – todos disputam uma posição privilegiada na tela das nossas mentes. Enquanto isso, observamos o caleidoscópio que esta falta de controle produz a partir da realidade externa. Tentar enxergar claramente as coisas através destes pedacinhos da vida flutuantes é um desafio permanente. É por isso que sentar-se, ir para dentro e dar de frente com uma mente descontrolada, não encoraja muitos a praticarem a meditação.

O que fazer? Aprender a ter maestria sobre a mente ou permitir que ela continue do jeito que é?

No próximo blog vou falar sobre este aspecto e sobre o que é chamado meditação mindfulness comparando com formas mais antigas de meditação.